terça-feira, 25 de setembro de 2007

A publicidade e o ensino do português



Gosto de publicidade. Não sou dos que mudam de canal quando chegam os intervalos. Seguramente por formação profissional, gosto de ver de que forma as marcas se apresentam ao público/consumidor, que estratégias usam, que canais utilizam. Sei que um bom anúncio tem de surpreender, tem de ficar na cabeça do espectador/ouvinte. Só assim a notoriedade da marca aumenta e a mensagem chega ao receptor. Mas mesmo percebendo isso, e compreendendo que se recorra ao humor e ao exagero, não suporto a publicidade com erros ortográficos ou, pior, que induz o espectador/ouvinte a um mau uso da língua portuguesa.
No Verão passado, o anúncio da bebida Decider, feita à base de cidra, terminava com a assinatura "Fica ciderado". Assim, com C. O aproveitamente era óbvio: cidra escreve-se com C, então toca a aproveitar a onda. Percebe-se a intenção: a mensagem que a agência criativa pretende é que o consumidor fique "ciderado", ou seja, fiel à cidra. Só que num anúncio destinado a um público-alvo jovem e urbano, num país onde se fala e escreve tão mal português, choca-me. Muitos terão ficado a pensar que siderar se escreve com C e não com S.
Agora, este ano, é a vez da Vobis apostar numa publicidade que, em rádio, é um convite à dúvida e ao erro. O spot de rádio da campanha de regresso às aulas começa com a voz da suposta professora na sala de aulas: "Meninos, vamos conjugar o VERBO tecnologia", ordena. E os meninos lá começam em uníssono: "eu jogo, tu imprimes, ele escreve, nós programamos, vós teclais, eles não fazem nada. Porque não foram à Vobis"*.
A ideia é simples e produz efeito. O problema é que a palavra "tecnologia" não é um verbo, é um substantivo. Nem mesmo na TLEBS, agora adiada para as calendas gregas... Quantos dos jovens estudantes a quem se dirige a publicidade, e que pouco sabem de português, passarão convictos a achar que "tecnologia" é mesmo um verbo conjugável?

Enfim, dir-se-á que os publicitários não são professores de português, não têm qualquer obrigação de ensinar.Mas sendo a língua portuguesa um património comum e uma ferramenta essencial para o seu trabalho, um pouco mais de imaginação não seria pedir muito...

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* As acções de cada tempo verbal retiradas do anúncio não serão exactamente aquelas, nem por aquela ordem, mas para o caso vai dar ao mesmo.

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